domingo, 21 de fevereiro de 2010

Regressão em busca do ovo

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Como e por que o não-nascido

se transformou num avestruz


O soneto abaixo foi extraído da Autobiografia de um que nunca nasceu, de Fiophélio Nonato, cujos originais, em estado lastimável, eu venho pouco a pouco decifrando e publicando aqui no blog. Este E il volatile va, porém, já não é inédito: foi publicado há dois dias no blog Hélio Jesuíno & Cia. Ltda. (aqui), que iniciou uma série de postagens sob o tema bestiário. Vale a pena acompanhá-la.

Lá o poema é escoltado por uma ilustração feita sob medida para ele. Esta que aqui está, catei-a em outra postagem do Jesuíno (uma baita entrevista com o genial Luis Buñuel), só para não perder o ótimo mau hábito de surrupiar seus desenhos.

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. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . E il volatile va

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Um dia, no fel de um desamar de novo,
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Cansei de ser um reles não-nascido
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . E rumei bem aquém do já vivido
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Para ser o meu começo num ovo.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Como na vida – esta, toda em azuis –
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Há que se ter grandeza em concretude,
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Descartei a sutileza e a virtude
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Do beija-flor: desabrochei avestruz.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Que graça pode haver em ser tal ave
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Com asas inúteis e ar de corrupto? –
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Perguntarão os mais meigos, de abrupto.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Não há espaço inexplorável, se a nave
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . É maior que o medo de pecar, mote
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Da Humanidade em seu precário bote.

Leia outros poemas de Fiophélio Nonato aqui e aqui.

ERRATA: A ilustração acima foi feita, na verdade, para o poema Soeur Vaseline (de Ricardo G. Ramos), também postado no blog do Jesuíno.

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5 comentários:

heliojesuino disse...

O hábito é saudável ao contrário de outros vícios dos quais, como todos sabem, vc é adicto assumido...
Apenas dê os crédito corretos: o desenho publicado é uma ilustração para o poema 'Soeur Vaseline' do Ricardo G. Ramos que copmo eu,vc, Fiophélio, e todas as criaturas cientes do absurdo de suas existências têm em Dom Luís um leniente para suas angústias.

Um abraço do paraceiro.

Tuca Zamagna disse...

Meus muitos vícios que todos, inclusive você, conhecem até que não são tão doentios. Há muito mais perversão entre o Inferno e a terra que eu piso do que supõem os que crêem no que assumo.

Fiz, no final da postagem, uma errata sobre o meu equívoco.

Lupe disse...

Bacana o poema do Fiophélio, Tuca. Bem coerente com a sina de não-nascido...

Aloisio Trobinski disse...

O Fiophélio é sempre surpreendente. E do caralho!

Tuca Zamagna disse...

Valeu, Lupe!

Valeu, Aloisio!