segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Partes

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"Para amar uma mulher por inteiro
é preciso se dividir em mil pedaços."
. . ¨. ¨ ¨. ¨. ¨. . ¨. ¨¨. . . . ¨¨. (Teophanio Lambroso)
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É noite. O cuco já não canta as horas, porque o cérebro, grudado feito uma craca no relógio, além de não permitir que a portinhola se abra, trava os dois ponteiros, senhor absoluto do tempo morto. Penduradas no lustre da sala, aceso, as pernas rebrilham, mas não têm forças nem para vagar à toa pelo teto. O fígado e o pâncreas se esparramam no armário de bebidas, entre garrafas de pinga, vodca, genebra, conhaque... todas vazias. A bunda está sentada, sem se perguntar para que, na bicicleta ergométrica. As tripas jazem na geladeira, sobre, envolvendo o pingüim, resignado, na sua passividade de louça. Os rins, o estômago e outras vísceras desapareceram, mas há tanto armário, tanta gaveta pela casa... Do saco, rasgado e separado do pênis, os testículos rolaram e foram adotados, como bolas de futebol, pelos três gatos. A cabeça, oca e sem o olho esquerdo, foi parar no tapete, junto com a barriga, vazia, e o peito, sem o coração, como se confabulassem sobre o problema comum da falta de estofo. Já os braços, o direito sem a mão, parecem tranqüilos embaixo da cama de casal, cruzados.

Muito antes de William Bernardes dizer boa noite, o olho esquerdo se fecha e cai – no sono e da poltrona – bem na palma da mão direita. Logo os dois se juntam, já na porta de casa, ao pênis, erecto, que controla com embaixadinhas o coração, ainda pulsando. E lá se vão os quatro para uma noite de orgia interminável, a iniciar-se num bar, assim que o coração, esmurrado pela mão direita e cabeceado pelo pênis, parar de bater, pronto para entrar na dança. Uma salsa – frenética, esquizofrênica, de tanto tesão de viver! Deflagrada pelo olho esquerdo que, ao despertar, sob a mesa em que os quatro se acoitam, reconhece, lá no fundo de um par de coxas entreaberto, o sorriso sem calcinha da parte mais enigmática da musa inspiradora do meu auto-esquartejamento.

Postagem de 30.11, repostada em virtude do acréscimo da ilustração de Hélio Jesuíno, extraída das páginas de Suíte Iconoclasta / Parte 3

8 comentários:

Mariana disse...

O texto tá ótimo, lindo mesmo. Mas, menino, que citação! Esse Teophanio é tudo mesmo! Emocionei-me! (E esquece o fato de que sou suspeita pra falar dele, tá?).
E Tuca, ja entrou pros favoritos, viu?
Beijo!

1 de dezembro de 2009 19:02

Tuca Zamagna disse...

Valeu, Mariana!!!

Que delícia ter por aqui a mulher mais especial de Maceió. Bem, conheço poucas além de você, mas se entre as milhares que não conheço tiver meia-dúzia do seu naipe, essa cidade é mesmo uma mulheravilha!

Só não gostei de você valorizar tanto assim a citação daquele pacóvio do Teopha. Mas, se isso a estimular a aparecer mais por aqui, vou postar não só frases do chapeludo, mas também textos maiores. E mais: criarei uma categoria só para as coisas dele, intitulada "Teopha da Mariana Maceió"...

Beijão

2 de dezembro de 2009 01:52

helvecio vieira disse...

aê cara esssa historia tá com nada falou
caô de ciganinha... xoxota enigmatica, tu naum saca eh de muleh vai fala de homem ashuashuashuah

2 de dezembro de 2009 06:14

Tuca Zamagna disse...

Não sou bom nisso, Helvecio, mas já que você está pedindo, na próxima postagem falarei de homem, daquele tipo de macho guerreiro que certamente lhe agrada. El Cid, o grande cavaleiro que luta contra o rei, para tentar aparecer um pouquinho e reacender seu ibope apagado.

3 de dezembro de 2009 03:18

helvecio vieira disse...

da um tempo aê meu, naum tenho nada com as tuas marra falou!

5 de dezembro de 2009 06:53

Marquesa disse...

Genial!Theofonio Lambroso é do caralho!

7 de dezembro de 2009 22:24

Tuca Zamagna disse...

Ele é danado mesmo, Marquesa. O rei das epígrafes. Mas me mandou um conto que diz que escreveu só pra cortar a onda do pessoal que o chama de frasista.

Não vou nem contar pra ele que você o elogiou. Primeiro, porque ele já é besta o suficiente. Segundo, porque você errou o nome dele. Teopha não suporta que as pessoas errem um nome, segundo ele, "tão comezinho, quase biritazinho".

8 de dezembro de 2009 21:25

Nane Guessa disse...

Puta que pariu tanta parte - FALA SÉRIO!