sábado, 20 de março de 2010

O venerável cordão de São Francisco

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A pedofilia praticada por padres está na moda há muitos anos – para não dizer há séculos. Mas agora o assunto pegou fogo, porque o que entrou na moda é denunciar os padres pedófilos. Chovem denúncias na Europa, e até o irmão do Papa está sendo acusado de ser conivente com sacerdotes que gostam demais de criancinhas. Aí o Sumo Pontífice tratou de se pronunciar, para tentar limpar a barra da Santa Madre Igreja – ou a da própria família, pelo menos. Disse ele, entre outras irrelevâncias, que o Vaticano sempre se preocupou com esse assunto. Puxa, que bom!

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Outra alta autoridade da igreja católica (esqueci o nome da figura) disse que mais grave do que isso é a questão do aborto. Me fez lembrar o Maluf com o famoso “Estupra mas não mata”. Ou seja, deduzo: se o padre não engravidar a criança, tudo bem.

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Então decidi postar um texto em homenagem à toda a rapaziada de batina que mija fora do penico: um trecho de Teresa Filósofa, best-seller no século XVIII, de autor anônimo. O romance conta a trajetória de uma jovem pobre, virgem e ingênua que busca o amor e o prazer. Entre seus preceptores está o padre Dirrag, cujo caráter Teresa fica conhecendo no trecho que se segue:

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No dia seguinte, às cinco horas da manhã, dirigi-me aos aposentos de Eradice, como havíamos combinado. Encontrei-a orando, com um livro na mão.

– O santo homem vai chegar – disse-me ela – e Deus com ele. Escondei-vos neste pequeno gabinete, donde podereis ouvir e ver até onde a bondade divina consente em se estender a favor de sua vil criatura pelos piedosos cuidados de nosso diretor. – Um instante depois, bateram suavemente na porta. Fugi para o gabinete, cuja chave Eradice pegou. Um buraco largo como a mão, na porta desse gabinete, (...) deixava-me ver livremente o quarto inteiro, sem correr o risco de ser percebida.

(...)

O bom Padre entrou:

– Bom dia, minha cara irmã em Deus! – disse a Eradice. – Que o Espírito Santo e São Francisco estejam convosco!

Ela quis se jogar aos seus pés mas ele a ergueu e a fez sentar-se junto dele.

(...)

– Vamos começar, minha cara filha – prosseguiu o Padre. – Cumpri bem os vossos deveres e estejais certa de que, com a ajuda do cordão de São Francisco e de vossa meditação, este piedoso exercício acabará numa torrente de delícias inexprimíveis. Ajoelhai-vos, minha filha, e descobri essas partes da carne que são o motivo da cólera de Deus: a mortificação que elas sentirão unirá intimamente o vosso espírito a Ele. Eu vos repito: esquecei-vos e abandonai-vos.

(...)

A Srta Eradice obedece imediatamente, sem replicar. Ela se ajoelha num genuflexório, com um livro diante de si. Depois, levantando as saias e a combinação até a cintura, deixa ver duas nádegas brancas como a neve e de uma forma oval perfeita, sustentadas por coxas de uma proporção admirável. (...) O Padre percorria com olhar esfogueado as nádegas que lhe serviam de perspectiva, e, tendo ele os olhos fixos nelas, eu o ouvi dizendo em voz baixa (...):

– Ah! Que belo colo! Que tetas encantadoras! – Depois se abaixava, levantava-se intercaladamente, resmungando alguns versículos. Nada escapava à sua lubricidade. Após alguns minutos perguntou à sua penitente se a sua alma tinha entrado em contemplação:

– Sim, meu Reverendíssimo Padre. – Ela lhe diz. – Sinto que o meu espírito se desliga da carne e vos suplico que comece a santa obra.

– Isto basta retomou o Padre –, o vosso espírito ficará contente. – Recitou ainda algumas preces e a cerimônia começou com três varadas que ele lhe aplicou bem de leve no traseiro. Estes três golpes foram seguidos por um versículo que ele recitou e, sucessivamente, por três outras varadas um pouco mais fortes do que as primeiras.

Depois de cinco a seis versículos recitados, (...) qual não foi a minha surpresa quando vi o Padre Dirrag, desabotoando as suas calças, pôr à mostra um dardo inchado, que era semelhante àquela serpente fatal que havia atraído as censuras de meu antigo diretor! Esse monstro adquirira o comprimento, a espessura e a firmeza preditas pelo capuchinho, ele me fazia estremecer. Sua cabeça rubicunda parecia ameaçar as nádegas de Eradice, que ficaram da mais bela cor encarnada. O rosto do Padre estava todo afogueado.

– Agora – disse ele –, deveis estar num estado mais perfeito de contemplação: a vossa alma deve estar desligada dos sentidos. Se a minha filha não engana as minhas santas esperanças, ela não vê mais, não ouve mais, não sente mais.

Neste momento, este carrasco fez cair uma saraivada de golpes sobre todas as partes do corpo de Eradice que estavam a descoberto. Contudo, ela não dizia nada, parecia estar imóvel, insensível a esses terríveis golpes, e nela, simplesmente, eu não distinguia mais do que um movimento convulsivo das nádegas, que se comprimiam e se descomprimiam a todo instante.

– Estou contente convosco – diz-lhe o Padre após um quarto de hora dessa cruel disciplina –, está na hora de começardes a gozar do fruto de vossos santos trabalhos. Não me escutai, minha cara filha, mas deixai-vos conduzir. Prosternai o vosso rosto contra o chão: com o venerável cordão de São Francisco, vou expulsar tudo que resta de impuro dentro de vós.

(...) Eradice acabava de ser posta de joelhos no chão, com os braços cruzados sobre o estribo de seu genuflexório e com a cabeça apoiada nos braços. (...) Esta perspectiva luxuriosa fixava a atenção do Reverendíssimo Padre, que se pusera, ele próprio, de joelhos, as pernas de sua penitente entre as suas, as calças abaixadas, o seu terrível cordão na mão, resmungando algumas palavras mal-articuladas. (...) Duas aberturas se apresentavam, ele as devorava com os olhos, embaraçado quanto à escolha: uma era um manjar delicioso para um homem de sua batina, mas ele prometera prazer, êxtase para a sua penitente. Como fazer? Ele ousou dirigir várias vezes a cabeça de seu instrumento para a porta favorita, na qual esbarrava levemente. Mas enfim a prudência predominou sobre o gosto.

Eu lhe devo esta justiça: vi distintamente o rubicundo príapo de Sua Reverência atravessar a estrada canônica depois de ter entreaberto delicadamente os seus lábios vermelhos com o polegar e o indicador de cada mão. Este trabalho foi iniciado por três vigorosas sacudidelas que fizeram entrar quase a metade dele. Então, de repente, a tranqüilidade aparente do padre transformou-se numa espécie de furor. Que fisionomia! Ah, Deus! Imaginai um sátiro com os lábios carregados de espuma, a boca aberta, às vezes rangendo os dentes, resfolegando como um touro que muge. Suas narinas estavam inchadas e agitadas, ele mantinha suas mãos levantadas a quatro dedos das ancas de Eradice sobre as quais via-se que ele não ousava se apoiar. Seus dedos afastados estavam em convulsão e adquiriam a forma da pata de um capão assado. Sua cabeça estava abaixada e seus olhos cintilavam, fixados no trabalho da cavilha mestra, cujas idas e vindas ele compassava de maneira que, no movimento de retroação, ela não saísse de sua bainha e que, no de impulso, seu ventre não se apoiasse nas nádegas da penitente, a qual, por reflexão, poderia ter adivinhado onde se encontrava o pretenso condão. Que presença de espírito! Vi que aproximadamente o comprimento de duas polegadas do santo instrumento ficou constantemente reservado do lado de fora e em nada participou da festa. Vi que cada movimento que o traseiro do Padre fazia para trás, pelo qual o cordão se retirava do abrigo até a cabeça, os lábios da parte de Eradice entreabriam-se e pareciam de uma cor encarnada tão viva, que encantavam a vista. Vi que por um movimento oposto, quando o Padre empurrava para a frente, esses mesmos lábios, dos quais então não se via mais do que o pequeno pelo negro que o os cobria, apertavam de forma tão exata a flecha, que ali parecia engolida, que teria sido difícil adivinhar a qual dos dois atores pertencia este pino pelo qual um e outro pareciam igualmente atados.

Que mecânica! Que espetáculo (...) para um moça da minha idade que não tinha nenhum conhecimento desse gênero de mistério! Quantas idéias diferentes me passaram pela mente, sem poder me fixar em nenhuma! Lembro-me somente que por vinte vezes estive a ponto de me jogar nos joelhos deste célebre diretor para suplicar-lhe que me tratasse como à minha amiga. Seria um movimento de devoção? Seria um movimento de concupiscência? É o que ainda me é impossível discernir bem.

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(Tradução de Carlota Gomes, para a L&PM Pocket)

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8 comentários:

Rindo de nervoso... ainda disse...

Bola sete, mestre Tuca. Perfeita ilustração para o tema em tantas pautas. Fiquei sem saber se partilhava o transe do santo homem, ou se me deixava açoitar pela culpa impregnada na educação cristã que polui meu inconsciente.
Uma historinha velha de quase meio século (de novo invadindo seu blog). No colégio católico da primeira adolescência, eu e dois camaradas surpreendemos em ação o religioso conhecido por sua severidade e seu moralismo. Nos fundos da cantina, ele bolinava a bundinha desnuda de um menino gordinho (juro que não era eu) que se entupia de guloseimas. Na zoeira clandestina que se seguiu, por algum instinto ético preservamos a identidade da vítima (juro, de novo, que não era eu). No jogo sombrio daí advindo, sofremos punições escamoteadas e fomos brindados com antipatias eternas. Pouco depois fui pra escola pública, território onde o cordão de Santo Francisco não mais alcançava a sacralidade.

Celio Bala disse...

Que loucura!!!

Mendonça disse...

Sensacional o post Tuca! A ironia rasgada da sua apresentação e, mais ainda, da ilustração casam bem com a fina ironia que emerge do moralismo eroticamente rasgado, esfarrapado por esse texto setecentista ainda tão atual.

Lupe disse...

Eu ri muito com a apresentação e a ilustração, Tuca, mas sobre o trecho do livro, fiquei mais confusa que a Teresa no final. Preciso falar com meu analista pra decidir se gostei ou não dessa orgia patalógica...rsrs

Elza Magna disse...

Eu não tive dúvida, Paulinho: mergulhei fundo no transe da Eradice!
A vida me ensinou que, infelizmente, a grande importância das religiões está em nos proporcionar devassos de altíssimo desempenho em camas inusitadas como um confessionário em plena missa, o chão frio embaixo da mesa de um bar lotado, o guarda-roupa de sua própria esposa, o fogão aceso da vovozinha de qualquer um...
Mas que delícia de historinha essa sua, meu lindo. Quanto ao gordinho da bundinha alisada, você seria capaz de sussurrar no meu ouvido mais uma jura de que ele não era você? Se fizer isso, juro que vou acreditar e lhe dizer quase gemendo: "Se vinga, se vinga com juros pesados em mim, meu gordinho da bundinha alisada!"

Loucura pouca, no sexo, é bobagem, né não, Bala?

Nossa, que comentário potente, Mendonça! Tá na cara que você tem pegada forte, gostosão!

Você é uma figuraça, Lupe. Se o seu analistar decidir que você gostou dessa "orgia patológica", não esquece de perguntar se ele topa decidir por mim o que fazer no divã dele no sábado à noite.

heliojesuino disse...

Cá pra nós , deve ser uma delícia ter esse tipo de poder sobre a mulherada.CAsar pra que?! Só iria acrescentar mais um pecado à orgia deles: o adultério...

Rindo de nervoso... ainda disse...

Fala sério, ô barbudo tarado! Vira pra lá esse sagrado cordão...

Elza Magna disse...

Tem toda razão, poderoso Jesuíno. Até este instante, eu achava mais rico e luxuriante a opção dos protestantes, que aboliram o celibato e criaram o divórcio, uma forma de proporcionar aos seus pastores não só a legalição do sexo em casa, como também a substituição da esposa já embruacada. Não entendia por que os católicos romanos resistiam tanto em promover essa mudança que, fundamentalmente, dava uma face moderninha à hipocrisia religiosa. Obrigada por me apontar o caminho da Verdade de Deus, amorzão!

Paulinho, meu gordinho da bunda alisadinha, isso lá é jeito de se dirigir a uma dama finíssima como eu, uma cortesã com Doutorado em Sexologia e Pós-Doutorado em Taras Sexuais de Arromba???
Claro que é, amorzão. Tava só brincando. Pode me chamar de barbudo tarado, de diabo rabudo, de nefelibata à milanesa... o quer melhor o satisfizer, seu taradinho.
Você me fez lembrar de uma época em que eu só raspava a parte alta da minha floresta negra. Tinha um vizinho taradão que adorava conversar com a minha fulurica, e sempre dizia a ela: "Seu nome é Eneas!"